sexta-feira, 19 de abril de 2019

Resolutividade na recepção do SUS


Como residente multiprofissional e conselheiro municipal de saúde tenho vivenciado algumas situações que me deixa muito triste no serviço público de saúde. Assim como a Atenção Primária é a porta de entrada do SUS, a recepção é a porta de entrada no serviço, e fará toda a diferença para que a população saiba como e onde encontrarão os serviços adequados de saúde para cada situação. Hoje as UBS e ESF seguem uma política de atendimento muitas vezes conflitante, aliás a maioria dos serviços sofrem com o mesmo dilema (atenção secundária e terciária). Dentre eles: 1- Longas filas de espera na recepção; 2- Horário para marcação de consultas; 3- Atendimento desumanizado; 4- Desinformação do serviço. Poderia citar outros, mas vou me prender apenas nesses, que têm sido bem evidentes na minha vivência.

O princípio de resolutividade, que é a capacidade do sistema em resolver situações relacionadas à saúde/doença dos usuários e/ou atendê-los de forma adequada em todos os níveis de atenção. 

Simone e Daiane. Acesso, saúde e resolutividade: Desafios e perspectivas do SUS. Unileste, MG, 2011.


Reflexão: Vou aqui expressar minha opinião à respeito do serviço. Como disse anteriormente, muitos são os fatores para melhoria do serviço, mas vou me prender em quatro pontos que tenho vivenciado no meu campo de atuação. 

O primeiro trata das longas filas de espera na recepção para receberem o primeiro atendimento. Algumas unidades usam o sistema de senha, o que reduz o acúmulo de pessoas em pé na fila, porém outras ainda usam o sistema de fila de espera, e por vezes não são organizadas, já que a unidade não dispõe de vigilante/portaria, o que ajudaria na ordem e harmonia do atendimento. Outro problema grave é que o acesso à prioridades é muitas vezes descumprido, pois os atendentes se concentram no computador e não percebem as pessoas na fila. A demora no atendimento é outro fator, muitas vezes o atendente precisa explicar várias vezes o serviço para o usuário, e isso acaba por deixar as pessoas insatisfeitas, mas na maioria das vezes é preciso. O usuário por não entender o serviço, acha que falta funcionário pra atender, pois visualiza três ou até quatro computadores na recepção, porém apenas um ou dois estão sendo usados. Ele não entende que no caso da ESF, apenas aquelas equipes em determinado momento estão atendendo. Esse é outro problema a ser discutido, cada equipe só atende o seu usuário, se não for de sua área de atuação, ele não é atendido. Onde fica a resolutividade nessa hora? 

O segundo ponto é a questão do horário para marcação de consultas, a maioria das unidades, senão todas, preconizam a marcação até as 13:00, se você não consegue marcar até esse horário, você não consegue consulta, o mesmo é válido pra outros serviços. O grande problema está na dificuldade que muitos não tem a disponibilidade do horário devido o trabalho e outros afazeres, a pergunta é, se é apenas pra marcar a consulta, por quê não o fazer em qualquer horário do serviço, já que irá apenas agendar no caderno. Não tem sentido essa lógica de marcar somente em determinado horário, isso fere um princípio do SUS de resolutividade. 

O terceiro problema é o atendimento desumanizado, aliás, um corriqueiro problema que afeta a maioria do serviço. Mas vou pontuar o seguinte, o usuário de fato não conhece a rotina do serviço, porém, é direito dele como cidadão ser informado e respeitado. Muitas vezes o atendente está fazendo outra rotina de trabalho, que não o atendimento propriamente dito, o que faz parte do serviço, pois existe uma burocracia a ser cumprida como protocolos, preenchimento no sistema, arquivamento, agendamento, enfim, como qualquer empresa. Entretanto, o usuário não é devidamente informado que apenas uma ou duas pessoas somente estão atendendo naquele momento, devido a outras funções a serem cumpridas, algo que ao meu ver é muito simples de ser resolvido, basta informar o usuário que aguarde um momento sentado ou gentilmente que em breve será atendido pela colega, ao invés de deixar o usuário "plantado" em pé na recepção durante um longo tempo, porque apenas uma pessoa está fazendo atendimento. Isso causa revolta e repúdio para qualquer pessoa em qualquer serviço de atendimento. Outra questão é a estupidez de alguns profissionais em achar que sua explicação foi suficiente, quando na verdade, a interpretação do usuário não foi eficaz, isso faz com que ele precise perguntar várias vezes a mesma coisa, aliás, muitos usuários têm deficit cognitivo. É preciso compreender melhor o outro em suas debilidades, e isso de faz com treinamento em serviço. E por fim, olhar o paciente nos olhos, isso não acontece na maioria das vezes, até porque os computadores e a disposição do balcão/mesa de atendimento são colocados de forma inadequada para uma comunicação eficaz com o usuário. É preciso rever a ergonomia de trabalho na recepção do SUS. Claro que o atendente também precisa perceber que do outro lado tem um ser humano em sofrimento e sua necessidade precisa, no mínimo ser ouvida, e atendida na sua integralidade. Tomar os dados do usuário não necessariamente precisa que os olhos estejam sempre no computador, olhar para o usuário a cada informação que se pede é no mínimo, possível de ser feito.

O quarto problema, por fim, tem haver com a desinformação. Infelizmente alguns profissionais despreparados não procuram se inteirar dos serviços prestados e acabam por dar informações inexistentes ou insuficientes. Isso acaba por atrasar um serviço que seria bem mais breve, ou influenciar na demora do processo de cura devido ao tempo perdido dentro do serviço. Muitas vezes a informação precisa é a melhor ferramenta da resolutividade, pois se bem manuseada, irá reduzir o tempo de sofrimento de alguém.

Nenhum comentário:

Postar um comentário